domingo, 3 de março de 2013

Pier Paolo Pasolini (1922-1975)

3. Na casa rural

Uma lua rósea vai surgindo ao fundo das filas de choupos; não parece sequer a lua, mas um pedaço ensanguentado e informe de qualquer grande e suave corpo desfeito.
O seu brilho lança sobre o pátio da casa rural, onde aliás reluz uma pequena lâmpada cor de pérola, uma luz de insustentável doçura.
A casa estende-se à sua volta, avermelhada e degradada; a rusticidade desvaneceu-se, na penumbra, e as formas daqueles dois silos, daqueles estábulos, daqueles muros de tijolo vermelho, são quase solenes.
No meio desta espécie de cenografia destruída, em silêncio, está Emília sentada no seu banco: na mesma posição que tomara quando se havia sentado.
A sua mala já não está no meio do pátio. Um pouco de luz filtra-se, de resto, pela porta de vidros da granja, e as cortinas brancas imaculadas na barrela estão levantadas. Por trás dos vidros, vislumbram-se os rostos das pessoas da casa que olham: para Emília, naturalmente.. Um velho, uma velha com um lenço preto, uma jovem esposa, um homem ainda jovem, mas gordo e demasiado vermelho, e quase encostados ao vidro, em baixo, os rostos, também eles redondos e ruborizados, dos dois rapazinhos, diligentes e inexpressivos. São sombras cinzentas ou apenas rosadas sob a alvura das cortinas. A lua não as tinge, enquanto faz, por outro lado, resplandecer o pátio, com o seu cimento destruído, os seus montes de areia, os seus tijolos vermelhos, como um pequeno lago ou como as valiosas ruínas de uma velha igreja.

Pier Paolo Pasolini, Teorema, Quasi Edições, 2005, p. 92

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