João Bénard da Costa, Quinze Dias no Japão, 2001
sábado, 29 de junho de 2013
João Bénard da Costa (1935-2009)
Há jardins – como os da Vila Imperial de Katsura, ou do Templo Tenriuji
em Quioto – em que o que se procura é prolongar no espaço construído o
espaço natural que o rodeia, por forma a que o jardim “espelhe” com a
maior precisão possível a paisagem circundante. Cada planta é o duplo da
que lhe está em frente, cada pedra a réplica da cascata «lá fora»
existente, cada cor a que se acorda com a tonalidade encontrada no
“exterior” (e com ela variando conforme as estações do ano). Através de
uma técnica conhecida pelo nome de shakkei as montanhas, quedas
de água, matas selvagens, são incorporadas no espaço do jardim, num
arranjo paisagístico em que o “cenário” se interpenetra com o que o não
é, de modo a restituir uma indissociável unidade e a multiplicar a
ilusão até aos limites do que já não podemos ou sabemos classificar como
tal. § Há jardins – como os do Palácio Imperial de Quioto – em que o
ideal a atingir é tornar a intervenção humana tão discreta que esta se
torne quase imperceptível. Como? Dispondo, por exemplo, entre a
vegetação comum uma planta rara que aparentemente com ela se confunde,
ganhando todo o seu valor pelo facto de não poder estar ali por “meios
naturais” e conferindo a todo o espaço um peso de invulgaridade, pela
mera presença de uma árvore ou flor inusual. É o caso da tangerineira do
Palácio de Quioto (a tangerineira é uma árvore raríssima no Japão) que
se destaca e confunde suficientemente das e com as plantas comuns que a
cercam, para que tudo adquira o sentido de um tesouro, passando
desapercebido a quem não distinga a diferente qualidade entre o “centro”
e as suas “margens”, ou a quem nem sequer perceba que há centro e
margens (pp. 69-70)
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